Tuesday, December 31, 2013

Testes psicotécnicos

3 Dangers Of Using Personality Tests To Screen Workers, na Business Insider:

In a report published in the University of Pennsylvania’s Journal of Labor and Employment Law, Susan J. Stabilet, a professor of law at St. John’s University, outlined a variety of issues—from flawed test results to possible discrimination—surrounding personality tests in the workplace.

Here are the three most relevant reasons you might want to steer clear of this hiring trend:

1. It can screen out great candidates. The idea is to figure out if someone’s personality “fits” a specific job position or not, but Stabilet says that although this may work for some professions, it won’t work for most of them. For example, if someone is applying for a firefighter position, the employer wants to know if that person has the potential of breaking down during an emergency. In other professions, however, it can be more difficult to determine the most efficient personality for the specific job. For example, what personality makes someone a good computer programmer? This is difficult to answer.

Additionally, the tests will likely give those with “mainstream” personality types a more positive reading, while creative, think-outside-the-box candidates “who may potentially become leaders and do extraordinary things for an employer may be weeded out,” Stabilet says.

2. Results may be flawed. In these types of tests, there’s always a chance that potential employees may simply respond how they think the employer wants. Therefore, the test results won’t be a true representation of their personalities.

In addition, “what is true of personality traits is also true of emotional states that may be revealed by test questions,” Stabilet explains. “It may be assumed that an unhappy home life will interfere with effectiveness at work, but this has not been generally demonstrated; indeed, some men may throw themselves into their work as a compensation for their frustration at home. Therefore, making assumptions about what emotional states should be sought is dangerous.”

Many of the most popular personality tests weren’t created to be used in the hiring process. For example, the Myers-Briggs test was developed for training and development, not hiring; therefore, its usage to screen candidates is questionable. The Myers-Briggs Type Indicator (MBTI) is a personality inventory commonly used in organizational settings in private industry, the federal government and the U.S. military.

3. There are privacy risks and the potential for discrimination. Since these questions are usually asked in a way where the significance of the answers are unclear, candidates may reveal ”private thoughts, beliefs and emotions, through his or her responses to questions,” Stabilet says. Companies that decide to administer these tests should keep in mind that employees should be given the choice to opt out.

Experts also fear that these tests may discriminate against certain groups, because candidates will answer questions depending on how comfortable they feel in the situation.

Although the law does not make it illegal for employers to administer personality tests during the hiring process, companies should seriously consider the number of issues, from validity and reliability of these tests to concerns about invasion of privacy and possible discrimination against minorities.
The Use of Personality Tests as a hiring Tool: is the Benefit Worth the Cost?[PDF), por Susan J. Stabilet:
The costs of making bad hiring decisions and the difficulties of getting meaningful information from reference checks of prospective employees have led many employers to use personality tests1 as part of their hiring process. Employers choose from a wide variety of tests in an effort to both weed out job candidates with undesirable traits, such as dishonesty, or tendencies toward violence or tardiness, and to judge the "fit" between the prospective employee and the job by seeking to identify prospective employees possessing personality traits likely to predict success in the job in question. Since the development of the first modem personality tests in the early part of this century, personality assessment has grown to a $400 million-a-year industry. While some employers are convinced that personality tests are akin to astrology and tell no more than an interviewer could learn during a standard interview, other employers swear by them and are convinced that they are hiring better workers as a result of their use.

The widespread use of personality tests as a means of determining which employees to hire raises a number of issues, ranging from the validity and reliability of the tests to concerns about invasion of privacy and discrimination against minorities. These issues raise the question whether the benefits of personality tests outweigh the costs of employing them. This article explores that question, considering whether personality tests are effective hiring tools, as well as the privacy and discrimination concerns implicated by their use. Neither of these concerns has been adequately addressed by the law, which does very little to regulate the use of personality tests.
Eu pessoalmente costumava chumbar tanto nos psicotécnicos (nomeadamente nos "psico-") como na entrevistas, logo imagino que qualquer possivel método de recrutamento de pessoal "discrimine" contra mim...

Uma ideia que me ocorre acerca do suposto "perigo" dos testes psicológicos serem enviesados a favor das pessoas mais "normais" - isso provavelmente é mais uma "feature" do que um "bug": vamos imaginar que as pessoas "normais" tendem a ter um desempenho profissional "normal" (salve a redundância), e que as pessoas "estranhas" são mais dadas a ter um desempenho profissional "estranho" (seja para cima ou para baixo, ou talvez eventualmente a mesma pessoa "estranha" tenha um desempenho excepcionalmente bom numas tarefas e excepcionalmente mau em outras); vamos também imaginar que o desempenho de uma equipa de trabalho tende a ser determinado pelo desempenho do trabalhador menos produtivo (o caso mais extremo será um trabalho "linha de montagem" em que cada trabalhador faz uma tarefa e depois passa ao seguinte que faz outra tarefa e assim por diante - nesse caso não haverá dúvida que a velocidade do processo total de trabalho é determinada pela velocidade do trabalhador mais lento; mas penso que, em maior ou menor grau, este principio aplica-se a qualquer grupo de trabalho em que os membros tenham funções diferenciadas e em que seja necessário todas as tarefas serem executadas para o trabalho estar concluído) - nesse cenário faz todo o sentido que as organizações perfiram pessoas "normais": os trabalhadores excepcionalmente maus prejudicam o trabalho e os supostamente excepcionalmente bons pouco ou nenhum benificio adicional trazem.

Monday, December 30, 2013

Re: As consequências sociais da austeridade

Pedro Magalhães descobriu algo surpreendente acerca dos efeitos sociais da austeridade em Portugal - pelos vistos foram muito menos graves do que noutros países (Grécia, Irlanda, Itália, Chipre e Espanha).

Ele (e eu) tem alguma dificuldade em perceber o porquê. No entanto, ocorrem-me algumas hipoteses:

Talvez o ajustamento português (em parte por culpa da Constituição) tenha sido mais à base do aumento da receita e menos à base da redução da despesa que nos outros paises, e isso tenha levada a menores custos sociais (os aumentos de impostos tendem a abrangir toda a gente, enquanto cortes na despesa tendem a concentrar-se um grupos especificios, o que pode causar mais trantorno social)?

Talvez, na medida em que houve cortes na despesa, esses tenha sido essencialmente os tão criticados "cortes cegos" (a redução remuneratória, os cortes no subsidios de férios e natal) em vez da tão desejada "reforma do Estado" (com extinções de serviços, despedimentos, etc.), o que de novo é menos traumático em termos sociais (cortar 5% do vencimento a toda a gente é menos dado a fazer pessoas cairem na pobreza do que despedir 5% do pessoal)?

O que me ocorreu a propósito dos atentados em Volgogrado

Confesso - para quem cresceu vendo documentários e filmes sobre a II Guerra Mundial (quando era novo, era rara a altura em que não houvesse uma série - documental ou de ficção - sobre essa guerra em exibição na RTP), "Volgogrado" soa um bocado estranho.

Tuesday, December 24, 2013

Jesus Is an Anarchist, by James Redford

dos arquivos fundos do anti-state.com

Jesus Is an Anarchist, by James Redford

Competição e autonomia

Na discussão entre o Hugo Mendes e o Alexandre Homem Cristo sobre a queda dos resultados educativos na Suécia, o segundo aventa a hipótese de que a causa mais provável esteja na autonomia ("não enquadrada") das escolas, e não tanto na competição.

Mas o ponto da competição entre escolas não é exactamente competição entre modelos educativos diferentes? Logo não me parece que faça grande sentido separar a "competição" da "autonomia"; ou melhor, não é muito difícil ter "autonomia" sem "competição" - a escola em que eu cresci (1979-1991) era mais ou menos isso - um sistema de ensino público, em que os alunos iam para a escola da sua área de residência ou do emprego dos pais (a partir do 10º ano, para a escola em que houvesse a área que queriam), e em que as escolas eram largamente auto-geridas (e em que, na sala de aula, cada professor ensinava à sua maneira e muitas vezes escolhia - face à extensão dos programas - qual a matéria a dar).

Mas o oposto, "competição" sem "autonomia" é dificil de perceber o que seria (bem, podemos imaginar um sistema em que uma autoridade central decidisse programas e métodos diferentes para escolas diferentes, e depois essas diferentes escolas fossem competir umas com as outras com base nessas diferenças centralmente determinadas; podemos realmente imaginar isso, mas parece-me um sistema absurdo).

É verdade que AHC não fala em acabar com a autonomia, mas em "enquadrá-la" (ou seja, limitá-la); mas defender a limitação da "autonomia" implica, na prática, defender a limitação da "competição" (mas é interessante como, pelos vistos, na moderna mentalidade liberal, "competição" parece ter uma maior carga positiva que "autonomia", para acharem que o maior problema no "cheque-educação" sueco estar na "autonomia" e não na "competição").

Mas isto chama uma questão mais profundo - é que os chamados defensores da "liberdade na educação" não são realmente nada entusiastas da "autonomia" (e daqui para a frente, neste post, jã não estou a falar especificamente do AHC, nem conheço o seu pensamento acerca de muitos assuntos que vou referir); pelo menos no que se refere à escola pública, muitas vezes essa área politica parece ser a maior defensora da centralização, via mega-agrupamentos, directores nomeados, fim da gestão democrática, guiões hiper-detalhados determinando metas de aprendizagem, (por vezes até vêm com conversas de "livro único"), etc., etc. Na verdade, por vezes até parece que o tal "centralismo burocrático estalinista do Ministério da Educação" tem como problemas fundamentais os concursos nacionais de professores e as regras determinando em que escolas os alunos se podem matricular, e em tudo o resto o centralismo já não faz mal.

O que me leva a pensar que o ponto  fundamental de muitos dos defensores da "liberdade da educação" não é tanto que que numa esquina uma escola tipo Summerhill e noutra uma para "Tiger Moms", mas sobretudo que as escolas possam facilmente expulsar (ou negar a matricula a) alunos e despedir professores.

[Post publicado no Vias de Facto; podem comentar lá]

Friday, December 20, 2013

Omissões

O Rodrigo Moita de Deus e o Afonso Azevedo Neves deixaram de lado vários pontos importantes (ou mesmo vitais) para a compreensão da matéria em apreço:

- o Comité de Apoio à Reconstrução do Partido Marxista-Leninista (CARP-ML) resulta de cisão do Comité Marxista-Leninista de Portugal (CML de P), que é, por sua vez, uma dissidência do CM-LP

- após a fundação da UDP, aderiram a esta (ou ao Partido Comunista Português (Reconstruído) - PCP(R) - que era a mesma coisa) o Partido de Unidade Popular (PUP) e a maior parte da Organização Comunista Marxista Leninista Portuguesa (OCMLP); o Partido de Unidade Popular (PUP) é o resultado de uma cisão no Partido Comunista de Portugal (Marxista-Leninista) (PCP-ML), que foi o novo nome que o CM-LP adoptou para aí a partir de 1970; a Organização Comunista Marxista Leninista Portuguesa (OCMLP) é o resultado da fusão entre os colectivos organizados em torno dos jornais clandestinos "O Grito do Povo" e "O Comunista"; "O Comunista" surgiu também de uma cisão do CM-LP

[fundamentalmente, as várias cisões e dissidências que o CM-LP e depois o PCP-ML foram tendo entre 1964 e 1974 acabaram por se juntar na UDP]

- A Frente de Esquerda Revolucionária (FER) surgiu da fusão entre a Liga Socialista dos Trabalhadores (LST), a Esquerda Revolucionária (ER) e a Organização Comunista Politica Operária (OCPO), embora esta ultima tenha abandonado a FER cerca de duas semanas após a sua criação; a Liga Socialista dos Trabalhadores (LST) surgiu de uma cisão do PSR (fundamentalmente a partir dos antigos militantes do ex-PRT); embora não pertença à árvore genealógica do BE (porque saiu da FER muito antes desta integrar o BE, ou mesmo de existir BE*), convém notar que a Organização Comunista Politica Operária (OCPO) resulta de uma cisão do Partido Comunista (Reconstruído) - PC(R), que era a mesma coisa que a UDP.

[o fundador e principal ideólogo da Organização Comunista Politica Operária (OCPO), Francisco Martins Rodrigues, foi também o fundador e/ou um dos principais ideólogos do CM-LP, do Comité de Apoio à Reconstrução do Partido Marxista-Leninista (CARP-ML) e da UDP]

*eu ia escrever "antes de alguém sonhar com o BE", mas seria incorrecto, já que a própria criação da FER foi o resultado de alguém ter tentado criar um "BE" 10 anos mais cedo (penso que o PSR também tinha sido convidado para a fusão, mas não se mostrou interessado).

Thursday, December 19, 2013

Portugal com a maior quebra da produtividade da OCDE?

Segundo o Público, "a produtividade do trabalho (medida como o produto por pessoa empregada) também caiu em Portugal de forma muito forte no terceiro trimestre do ano. De acordo com a OCDE, a descida deste indicador foi de 1%. Apenas mais três países registaram quebras: a Suécia, com 0,2%, e a Áustria e a França, com 0,1%."

Confesso que, quando comecei a ler a notícia ("Portugal foi o país da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) que registou durante o terceiro trimestre deste ano uma descida mais acentuada das remunerações por unidade produzida e da produtividade do trabalho."), pensei que houvesse algum engano; porquê? Porque as "remunerações por unidade produzida" são equivalentes a [total das remunerações]/[total de unidades produzidas]; e a "produtividade" (no contexto deste estudo) é equivalente a [total de unidades produzidas]/[total de trabalhadores].

Isso quer dizer que:

[remuneração por unidade produzida]=[total das remunerações]/[total de unidades produzidas] ↔

↔ [remuneração por unidade produzida]={[total das remunerações]/[total de trabalhadores]}*{(total de trabalhadores]/[total de unidades produzidas]} ↔

↔ [remuneração por unidade produzida]=[remuneração média]/[produtividade]

Ou seja, é muito dificil a "remuneração por unidade produzida" e a "produtividade" descerem ao mesmo tempo (e sobretudo terem ambos uma grande quebra)- tal implica que, não só que a produtividade desça, mas que as remunerações desçam ainda mais (se as remunerações por unidade desceram 1,4% e a produtividade desceu 1%, então os salários terão que ter descido 2,4%); por isso quando li o título até pensei que fosse alguma confusão do jornalista (que o que tivesse descido não tivesse sido "os salários e a produtividade", mas sim os "salários face à produtividade" ou coisa parecida), mas lendo a noticia toda, parece que foi mesmo isso: tanto os custos unitários do trabalho como a produtividade desceram (ver adenda).

Os salários descerem não tem nenhum mistério - é o que e suposto ocorrer durante uma recessão e sob uma politica de austeridade; já a quebra da produtividade é mais misteriosa (talvez a queda dos salários tenha tornado viáveis actividades económicas pouco produtivas - que antes nem se chegavam a realizar - fazendo assim baixar a produtividade média?)

Já agora, seria útil saber se essa queda é comparada com o segundo trimestre deste ano, ou se é com o terceiro trimestre do ano anterior.

Adenda - achei a informação no site da OCDE; aqui temos um PDF com os dados por país.

Pelo que vejo na página 4 do PDF, os custos unitários do trabalho desceram 0,4%, a produtividade desceu 1%, e os salários por unidade de trabalho desceram 1,4% (o que faz sentido: 1% + 0,4% = 1,4%). Eu dá-me a ideia que a noticia do público confude os "custos por unidade produzida" (que desceram 0,4%, quando a noticia refere 1,4%) com os "custos por unidade de trabalho" (que, esses sim, desceram 1,4%).

E trata-se de uma comparação trimestre a trimestre, pelo que percebo.

Monday, December 16, 2013

A crise irlandesa foi culpa das agências de rating?

Segundo três economistas suiços, sim [pdf].

[Como já escrevi várias vezes, eu linkar um artigo não implica necessariamente concordância]

Saturday, December 14, 2013

As classes sociais de acordo com a BBC

A BBC tem uma espécie de "modelo" das "classes sociais" no Reino Unido, com um "calculador" para se determinar a que "classe" cada um pertence (via The Heresiarch):

  • Elite: This is the most privileged class in Great Britain who have high levels of all three capitals. Their high amount of economic capital sets them apart from everyone else.


  • Established Middle Class: Members of this class have high levels of all three capitals although not as high as the Elite. They are a gregarious and culturally engaged class.


  • Technical Middle Class: This is a new, small class with high economic capital but seem less culturally engaged. They have relatively few social contacts and so are less socially engaged.


  • New Affluent Workers: This class has medium levels of economic capital and higher levels of cultural and social capital. They are a young and active group.


  • Emergent Service Workers: This new class has low economic capital but has high levels of 'emerging' cultural capital and high social capital. This group are young and often found in urban areas.


  • Traditional Working Class: This class scores low on all forms of the three capitals although they are not the poorest group. The average age of this class is older than the others.


  • Precariat: This is the most deprived class of all with low levels of economic, cultural and social capital. The everyday lives of members of this class are precarious.


  • Agora vou fazer um exercicio que não faz sentido - responder às questões do tal "calculador" (não faz sentido porque tem lá questões sobre ordenados, e os ordenados britânicos são maiores que os portugueses); pelos vistos eu seria "traditional working class" (multiplicando por 3 as respostas nas questões que têm a ver com dinheiro, seria "technical middle class", o que é capaz de ser mais correcto).

    Suspeito também que muitos dos autodesignados "precários" correspondem mais aos "emergente service workers" do que ao "precariat".

    Friday, December 13, 2013

    Macro e micro

    Tem havido, na internet anglófona, uma discussão sobre se, nos cursos de Economia, se se deve começar primeiro pela micro ou se se deveria começar pela macro.

    Provavelmente isto tem a ver com alguma grande diferença entre o sistema univesitário português e norte-americano, mas eu creio que comecei primeiro pela macroeconomia (no ano lectivo de 1991/92, no ISEG, o primeiro semestre da cadeira de Análise Económica I era macroeconomia e o segundo era microeconomia).

    Mas o ponto que quero levantar até é outro - porque não ensinar microeconomia e macroeconomia na mesma altura, em vez de uma ter que ser depois da outra (aliás, olhando para o atual plano de estudos do ISEG - pdf - vejo que, do 2º ano para a frante, macro e micro são ensinadas em paralelo)?

    Monday, December 09, 2013

    O site do Diário da República

    Adenda: afinal, embora esteja sob o título "Serviços por Assinatura", os não-assinantes continuam a poder clicar nos links como "I SÉRIE DO DR"  e fazer lá pesquisas simples.

    Post original:

    Neste momento, o site do Diário da República está reduzido a uma inutilidade.

    Poderá ser apenas um problema técnica, mas há algo que me parece "ter água no bico" - veja-se a secção dizendo "Serviços por assinatura", onde parece incluir montes de coisas que até agora não necessitavam de assinatura (até agora, qualquer pessoa podia fazer uma busca por diploma especifico, ou por um diário de qualquer dia das últimas décadas, e a assinatura só era necessária se quisesse procurar por diplomas sobre um assunto especifico, como decretos-leis contendo a expressão "Barlavento Algarvio")



    Os vários Mandelas

    Mandela the Revolutionary, por "Phil":

    As I write, the obituary portraits are being updated and given the requisite spin. For official politics it will be Saint Mandela, the liberal hero. For the hard right it will be Mandela the terrorist, the man who waged a brutal war against the authorities. And for the far left, it's Mandela the sell-out - the leader who oversaw neoliberalism in South Africa and the supplying of arms to anyone who could pay. The figure of Mandela is contested because he is, perhaps, all these things. And more.

    Friday, December 06, 2013

    8 anos de Vento Sueste

    Hoje, este blog faz 8 anos.

    A titulo comemorativo, relembro alguns posts que publiquei neste último ano:

    Um Estado ou o inverso de um Estado?, sobre a definição de "Estado" e a organização social das tribos do Atlas marroquino

    O bitcoin e concorrência entre várias moedas

    Direita e Esquerda (post N+1 sobre o assunto), mais um post sobre a diferença entre direita e esquerda

    Re: Impossibity of Anarcho-Capitalism, Re: Impossibity of Anarcho-Capitalism (II) e Re: Impossibity of Anarcho-Capitalism (III), uma análise ao artigo Impossibility of anarcho-capitalism [pdf], de Tony Hollick
     
    Re: dicionário elementar, Exemplos de conservadores defendendo a intervenção do Estado na moral social e Ainda a esquerda anarquista pró(?)-propriedade privada, em resposta ao post de Rui Albuquerque n'O Insurgente, esquerda e direita: dicionário elementar (2)
     
    Os economistas e a crise, sobre o papel que os economistas tiveram (ou não...) na crise financeira de 2008 

    Thursday, December 05, 2013

    Asimbonanga (Johny Clegg & Savuka, 1987)

    Senhas para refeições (ou "RSI em gêneros") e controle de capitais

    Food stamps are just capital controls for poor people (New Statesman):

    The Guardian's Patrick Butler reports that food stamps are to replace the cash payments currently received by vulnerable people in short-term financial crisis (...).

    In classic economics-blogging style, here's another news story. Cyprus is to impose capital controls (...)

    The link is that both measures won't have the absolute effect that their promotors might hope; rather, they impose a huge, uncontrollable and grey-market tariff on attempts to do what people are used to being able to do freely.

    The Cypriot capital controls are the more obvious example of this. For the next week, a euro in Cyprus is worth less than a euro elsewhere. How much less, we don't know, and there will probably never be a clear market rate – especially if the controls are lifted in early April, which the people of Cyprus will surely be hoping will happen.

    Nonetheless, if a Cypriot finds themselves urgently needing to get a large number of euros out of the country – say, to close a purchase on a house in the French Riviera – it's relatively obvious what they have to do. Offer someone in the "real" eurozone a quantity of euros in Cyprus to spend the money for them. The premium offered depends on the risk that the capital controls will not be lifted, as well as the value our outsider places on euros which can only be spent in Cyprus, but it's fairly doable from a technical point of view. (...)

    Those effects are basically the same as what we will see if food stamps become widespread. It's best to think of food stamps as a separate currency; one which can only be used buy a certain list of items. Just like the Cypriot euro, it has "capital controls" – you can't just walk up to a bureau d'exchange and hand food stamps in and get pound sterling in return. But just like the Cypriot euro, there are ways – easy ways – of getting around them.

    The legal way – analogous to the complicated deal to hand over money in two nations – is as simple here as offering someone a £20 food stamp for a £12 bottle of gin. Given most people buy food, that's a relatively good deal for the person who ends up with £8 profit; they essentially get a portion of their groceries paid for by someone in crippling financial need. (...)

    In the end, then, what is the outcome of food stamps? All things considered, they don't force people in financial difficulty to spend their money on "necessities" rather than "luxuries" (with the two categories odiously defined by government, rather than the individuals themselves). Instead, they impose a tariff on purchases of "luxuries" for those people.

    The same economic effect could be had more directly by requiring shops to display two prices for booze and fags: a regular price, and a higher price for "poor people".



    http://www.newstatesman.com/economics/2013/03/food-stamps-are-just-capital-controls-poor-people

    Tuesday, December 03, 2013

    Luta de classes vs. "causas fracturantes"?

    Class vs. “Identity Politics,” Intersectionality, Etc.: Some General Observations, por Kevin Carson (Center for a Stateless Society):

    Those of us involved in various justice movements of the Left sometimes argue among ourselves as though the struggles for class, racial and gender justice existed in a zero-sum relationship.

    Many people in the workers’ and economic justice movements complain — rightly so in my view — that “identity politics” in far too many cases became a substitute for class struggle, with racial and gender justice movements led by upper middle-class managerial-professional types focusing almost entirely on equal representation in the professions and boardrooms at the expense of economic justice. This approach is commonly derided as “black, female, etc., faces in high places.”

    We can see this in the recent high profile coverage of the version of feminism promoted by Yahoo CEO Marissa Mayer and Facebook COO Sheryl Sandberg. Mayer, notably, was hailed as a triumph of feminism at the very time when she’d been showing her contempt for working mothers by eliminating Yahoo’s work-at-home arrangements.

    On the CNN special “Black in America” several years ago, Soledad O’Brien cited, as evidence of the fulfilment of MLK’s dream, the fact that “Some are Secretary of State; some are CEO” — a source of some dismay for those of us whose fondest dream is to strangle the last Secretary of State with the entrails of the last CEO

    But some of the above-mentioned critics from the economic justice movement go even further, blaming gender and racial “identity politics” as a distraction from the class struggle. The struggle for labor rights and economic justice should take precedence over racial and gender justice, they say, because racism and sexism have been subsumed to a large extent within the class struggle. And to the extent that structural racism and sexism, homophobia and transphobia continue to be real problems, the victims of such oppression should throw in with the economic justice movement and treat winning the class struggle as their immediate priority — after which the working class will return the favor by shifting its fraternal efforts to the racial and gender justice fronts.

    This goes too far — way too far. First of all, it’s not just a question of priority. It’s a matter of people not being actively horrible to one another. The most radical members of one social justice movement are frequently the most bigoted and hateful voices against victims of other forms of oppression. A good example is the slew of radical feminist writers at The Guardian, the American RadFem (and, ahem, corporate trademark lawyer) Cathy “Bug” Brennan, and Rosanne Barr — all of whom have assaulted transgender people with the most vile, toxic abuse imaginable. RadFems also commonly take a dismissive and patronizing attitude toward sex workers, ignoring their own agency and preferences in the quest to criminalize sex work “for their own good.”

    Second, for those who mercifully do at least recognize in principle the validity of other struggles against oppression, it’s important to recognize that these struggles are not in a zero-sum relationship with one another. They are complementary and cumulative. (...)

    Differential levels of oppression and exploitation are a lever for maintaining the system of exploitation by the privileged classes. An economic justice movement that fights for the rights and empowerment of workers, without specifically addressing the special needs of the victims of racial and gender oppression in its ranks, is a gravely weakened and divided movement.

    Access to underpaid and exploited minority, female and unskilled labor undermines the bargaining power of white, male, skilled labor. Industrial managers in early 20th century labor struggles, who deliberately chose unemployed blacks as scabs to break strikes, understood this. So did big farmers in the South who exploited racial divisions to break the tenant farmers’ union. So, on the other side, did the Wobblies and CIO, who eschewed the racial segregation that so weakened the AFL’s craft unions.

    Intersectionality undermines the ruling class’s “divide and conquer” strategies of labor market segmentation as a strategy for weakening the bargaining power of labor. The workers’ movement, as such, by giving additional aid to the most disadvantaged and oppressed segment of the labor force, increases the power of labor as a whole.

    Meanwhile, there is a sense in which the struggle for economic and material justice, for everyone’s control over the means of livelihood, is of central importance to racial and gender justice movements. The reason is that even primarily non-economic forms of injustice, like racial and gender oppression, depends to a considerable extent on control over access to the means of material subsistence.

    Much of the leverage not only for class and economic oppression, for oppression on the basis of race, gender, sexual preference and gender identity as well, comes from the ability to obstruct access to the means of independent livelihood, and to withhold or take away the prerequisites of comfortable subsistence. the extent to which they are in what Friedrich Engels called the “realm of necessity,” as opposed to the “realm of freedom.” (...)

    Let’s consider a few examples. When the price of land falls precipitously as a result of vacant land no longer being held out of use by artificial land titles, and vernacular building technologies like cheap, snap-together, modular housing designs become widely available without obstruction from local building codes, discrimination in rental housing will likely be significantly less important than it is now. The larger the share of our necessities of life that can be met through self-provisioning in the informal and household sector rather than paying for them with money earned through wage employment, the less will be the proportional effect of job discrimination on our access to the means of subsistence. If freed slaves after the Civil War had received “forty acres and a mule” from broken up plantations, and had been in widespread possession of the means of armed self-defense, the material balance of power would have been far different from that which allowed the reimposition of white rule after 1877. (...)

    The less a person’s material dependence on others for survival, the more it becomes feasible for her to pick and choose her interactions with others, and interact only on terms of dignity and equality. When the majority of people in a society — including oppressed racial and gender groups — obtain the lion’s share of their material subsistence needs independently of the will or whim of others, and are in the habit of seeing themselves as free economic agents in independent control of their own means of livelihood, the spillover effects will color their relations with one another in other areas of life as well.

    Monday, December 02, 2013

    Leis e magia

    The Magic of the Law, um artigo no Overthinking It expondo a tese de que a magia na ficção acaba por ser muito semelhante ao Direito (nos comentários, a conversa depois evoluiu para uma discussão sobre o padrão-ouro e a economia no mundo do Harry Potter).

    Já agora diga-se que, na minha opinião, a personagem "Rumplestiltskin/Gold" na série Era uma vez... parece feita de propósito para ilustrar a tese do artigo...

    Saturday, November 30, 2013

    Re: Mais que um jogo

    Há dias, o Vitor Cunha do Blafémias publicou um texto que, sinceramente, me pareceu um bocado bizarro (ao contrário das reflexões perfeitamente normais que eu costumo publicar aqui).

    No clube de futebol local, a equipa de crianças dos 6 aos 9 anos apenas aparenta a idade fora de campo; quando delimitados pelo rectângulo tornam-se mártires voluntários por uma causa que não articulam. Transcendendo o frio, a dor, o cansaço e a sua própria incapacidade para perceberem o jogo, correm com o objectivo único da sublime visão de uma bola a entrar na baliza. Nestas idades é pouco importante a baliza onde o golo ocorre, desde que ocorra. É primário, instintivo, tão bélico como sexual – inerentemente masculino – completamente biológico, completamente individualista. O resultado da equipa é irrelevante: importante é que a criança vença o jogo, bastando para isso um golo mais que qualquer um dos outros, seja em que baliza for, seja de que equipa for. As crianças não querem saber do “bem comum”, não fazem ideia do que isso seja e não é claro o momento em que os adultos de uma dada geração os transformam para assimilarem a dialéctica de comunidade enquanto mantêm o primarismo biológico da individualidade.

    O treinador – mister na adoptada nomenclatura anglo-saxónica – torna-se no absolutista de Hobbes, garantido o contrato social através do poder absoluto da punição pela recolha ao banco de suplentes. O resultado expande-se sem que o diferencial da satisfação pelo golo se dilate: golo é golo. No fim vencem todos, mesmo os derrotados, os que marcaram menos ou nenhum golo: venceram o objectivo (goal) de no próximo jogo transcenderem novamente a sinédoque da vida que os espera quando o estatismo os aglutinar.
     Não sei se se o Vitor Cunha queria chegar a alguma conclusão mais geral aqui ou se era uma simples comentário sobre o futebol infantil, mas de qualquer maneira, basta pensar num simples situação para todo o seu argumento deixar de fazer sentido - e se, em vez de um jogo de futebol no clube local, com um mister, estivermos a falar de um jogo autorganizado no recreio da escola (nos meus tempos de escola primária, costumava haver jogos de futebol durante o intervalo; imagino que ainda os haja)? Aliás, imagino que a maior parte das crianças da idade 6-9 passem muito mais tempo a jogar no recreio do que em clubes.

    A própria existência de jogos infantis sem mister deita por terra a tese que é a sua autoridade que obriga as crianças a se sujeitarem ao "bem comum"; claro que há um contra-argumento - é que nos jogos autogestionários continua a haver um mister, um "mister colectivo" constituído pelo resto da equipa, com o seu equivalente a "ficar no banco" ("não jogas mais connosco"); mas o próprio facto de, nesses jogos, as crianças preferirem jogar com uns (normalmente os melhores) em vez de com outros (por regras os mais azelhas) demonstra que, mesmo para as crianças, a equipa é importante - afinal, se cada um se estivesse a lixar para o resultado da equipa e só quisesse marcar os "seus" golos, pouca diferença lhe faria que os seus colegas de equipa jogassem bem ou mal.

    Agora uma nota pessoal - entre os 6 e os 9 anos, só me lembre de ter jogado futebol no recreio uma vez; a nossa brincadeira favorita era mesmo andar à pedrada (na primeira e na segunda classe, era a nossa turma contra a outra turma da primeira/segunda classe; na terceira/quarta classe era contra a turma da segunda/terceira - que, embora andassem um ano atrás, eram quase todos mais velhos que nós); mas a dinâmica colectiva de uma batalha de pedras é mais ou menos a mesma que a de um jogo de futebol, logo penso que a minha experiência de vida algo idiosincrática em nada põe em causa o que escrevi acima.

    Para falar a verdade, até suspeito que as crianças no escalão 6-aos-9, se alguma coisa, até são mais dadas que o "público em geral" a desenvolverem lealdades a pequenos grupos (por alguma razão isto tem artigo na wikipedia). Mas se quisermos extrapolar daqui para uma reflexão mais geral sobre a natureza humana, suspeito que corremos o risco de chegar à conclusão que os humanos serão institivamente "tribais" e que tanto o individualismo como o colectivismo-universalismo serão algo contranatura (uma conclusão que talvez não agrade nem a esquerdistas nem a liberais...).

    Monday, November 18, 2013

    O RBI pode fazer baixar os salários? (II)

    Na Rubra, Rivania Moura publica o artigo "Defendemos que as pessoas vivam com o mínimo possível?" (via Raquel Varela), em resposta ao meu post anterior sobre o RBI.

    A respeito dos pontos 1, 2 e 5 (sobretudo do 2), parece-me que Rivania Moura está a argumentar que o RBI é pior para os interesses dos trabalhadores (e dos que gostariam de ser trabalhadores mas não conseguem...) do que outras politicas que poderiam ser seguidas. Mas o meu ponto é que, se tudo o resto for igual, o RBI fará subir (ou não minimo, não fará descer) os salários. Claro que se formos comparar um mundo com RBI e uma politica orçamental de austeridade e contração da economia com um mundo alternativo sem RBI com uma politica orçamental expansionista visando o pleno emprego, provavelmente os trabalhadores viverão melhor e os salários acabarão por ser mais altos no segundo do que no primeiro; mas acho que o que faz sentido é analisar os méritos de uma proposta politica comparando-a com o que aconteceria se essa proposta não fosse implementada, não tanto com o que aconteceria se, em vez dessa proposta, fosse implementada outra (ainda mais tratando-se de propostas que não são incompativeis entre si).

    É verdade que, de certa forma, há um potencial conflito entre o RBI e outras politicas alternativas - o tempo dos militantes e ativistas de esquerda é um recurso limitado, e portanto cada minuto, post, manifestação, conferência, panfleto, etc., feita a defender o RBI poderá significar menos um feito a defender politicas melhores. Logo, por esse caminho, a defesa do RBI poderia levar a uma má situação para os trabalhadores (pelo efeito da "energia" gasta pelos ativistas pró-RBI deixar de ser utilizada na luta por causas mais vantajosas). Mas duvido que na prática esse efeito seja significativo.

    A respeito do ponto 3, de que um subsidio pago por igual a todos não redistribui rendimentos - efetivamente, pode-se dizer que um subsidio igualitário por si só não redistribui rendimento; mas o dinheiro para esse subsídio tem de vir de algum lado. Tem sido propostas várias fontes de financiamento para um RBI, mas o mais provável é que este fosse financiado via impostos - basta esses impostos serem progressivos ou mesmo proporcionais para haver redistribuição (já que os que mais têm vão pagar mais para um bolo que depois vão ser dividido igualitariamente).

    Finalmente vamos ao ponto 4, o mais relevante do meu ponto de vista:

    O RBI fará baixar os salários todos, mesmo não sendo discriminatório como é o RSI (rendimento mínimo actual) ou o Bolsa família, ou o Cesta Básica da Argentina. Vejamos um exemplo. Imaginem que se fixava em Portugal o RBI a 200 euros. Ora, se existem trabalhadores a ganhar um salário de 500 euros e outros trabalhadores desempregados e sem salário, o rendimento acrescido de 200 euros fará que o primeiro passe a ter um rendimento de 700 euros enquanto o segundo terá de viver com 200 euros. Portanto, esse sistema continua a manter a concorrência entre os trabalhadores pelo emprego e continua a pressionar os salários para baixo.
    De novo, não se paercebe qual o mecanismo pelo qual o RBI fará baixar os salários - Rivania Moura escreve (provavelmente com razão) que o RBI continua a manter a concorrência entre os trabalhadores; mas para o RBI fazer os salários baixar (ou seja, fazer com que sejam menores do que seriam se não houvesse RBI), não basta que a concorrência se mantenha; para o RBI originar uma baixa de salários, seria necessário que fizesse aumentar a concorrência entre os trabalhadores. Ora, não estou a ver porque a concorrência para ganhar 700 em vez de 200 há-de ser mais aguerrida do que a concorrência para ganhar 500 em vez de zero (será mais de esperar o contrário, porque 500 euros adicionais fazem mais diferença a quem não tem nada do que a quem já tem 200 euros).

    [Post publicado no Vias de Facto; podem comentar lá]

    O "elo mais fraco" da zona euro

    A Holanda?

    Sunday, November 17, 2013

    "Bolhas"

    Uma critica por vezes feita a Paul Krugman é à sua passagem em (em tom aparentemente irónico), em 2002, de que para fazer a economia sair do crise motivada pelo fim da bolha das dot-coms, o FED teria que criar uma bolha imobiliária.

    Mas agora, pelos vistos, Krugman vem mesmo, de forma séria e supostamente "aprofundada", defender as bolhas como via para o crescimento:

    2. An economy that needs bubbles?

    We now know that the economic expansion of 2003-2007 was driven by a bubble. You can say the same about the latter part of the 90s expansion; and you can in fact say the same about the later years of the Reagan expansion, which was driven at that point by runaway thrift institutions and a large bubble in commercial real estate.

    So you might be tempted to say that monetary policy has consistently been too loose. After all, haven’t low interest rates been encouraging repeated bubbles?

    But as Larry emphasizes, there’s a big problem with the claim that monetary policy has been too loose: where’s the inflation? Where has the overheated economy been visible?

    So how can you reconcile repeated bubbles with an economy showing no sign of inflationary pressures? Summers’s answer is that we may be an economy that needs bubbles just to achieve something near full employment – that in the absence of bubbles the economy has a negative natural rate of interest. And this hasn’t just been true since the 2008 financial crisis; it has arguably been true, although perhaps with increasing severity, since the 1980s.
     
    Há primeira vista, custa-me a acreditar que possamos estar numa situação em que a taxa de juro de equilibrio entre a poupança e o investimento seja menor que zero: tal significaria que, mesmo sem receber juro nenhum, as pessoas estariam dispostas a poupar mais dinheiro do que as empresas estariam dispostas a pedir emprestado (mesmo sem pagar juros nenhuns). Tal só faria sentido numa economia em que a propensão à poupança fosse muito grande e quase não houvesse oportunidades de investimento lucrativo (nem uma coisa nem outra me parecem corresponder ao estado da economia mundial das últimas décadas).

    Mas, se essa visão estiver correcta, isso não será mais ou menos aquilo a que outra escola do pensamento económico chamaria "o estádio final do capitalismo"?




    Saturday, November 16, 2013

    O RBI pode fazer baixar os salários?

    A Raquel Varela deu uma entrevista à Dinheiro Vivo onde, entre outras criticas ao chamado "Rendimento Básico Incondicional" (termo que parece ter ganho a melhor sobre o meu "Rendimento Universal Garantido...), argumenta que este "ia de facto actuar como um RSI pressionando os salários de Todos para baixo".

    Não me parece que isso (tanto a respeito do RBI, como mesmo do RSI) faça grande sentido - qual poderá ser o mecanismo que faria o RBI baixar os salários?

    Em principio (assumindo as condições técnicas, como a produtividade, como um dado) o valor dos salários depende da facilidade ou dificuldade dos patrões em arranjarem trabalhadores: se for fácil contratar e se para cada empregado tiverem dois desempregados a pedir emprego, podem baixar os salários; se for difícil contratar e as vagas na empresa ficarem muitas vezes desertas, têm que subir os salários para atrair trabalhadores.

    Assim, para o RBI fazer baixar os salários, teria que aumentar a quantidade de pessoas que andam à procura de emprego, e assim permitir aos patrões baixar os salários. Ora, há alguma razão para pensar que, com o RBI, houvesse mais gente a querer trabalhar e estar empregada? Creio que não - na verdade, um RBI permitiria a alguma pessoas manterem o seu atual padão de rendimento trabalhando menos (p.ex., se eu ganho 1373 euros trabalhando 35 horas por semana, e passasse a receber 100 euros de RBI, poderia passar a trabalhar apenas 32 horas e meia, passando a ganhar apenas 1275 euros de ordenado, e com mais os 100 euros continuava a ganhar o que ganhava antes*). Assim, com algumas pessoas a querer trabalhar menos, o efeito disso sobre os salários seria para fazer subir, não para os fazer baixar.

    O que admito que provavelmente faria baixar os salários seria algo parecido ao EITC norte-americano, em que o estado subsidia os trabalhadores com baixos salários, mas não quem não tenha salário. Ai sim, os trabalhadores têm mais incentivo para aceitar empregos, porque aí a diferença entre aceitar ou não o emprego corresponde não apenas ao salário mas ao salário mais o subsidio.

    Para explicar melhor o meu raciocinio, vamos comparar quatro situações, em que é proposto a um trabalhador um emprego a ganhar 500 euros (em 3 delas há um subsidio estatal de 100).

    Sem subsidios nenhuns:

    Se o trabalhador aceitar o emprego: ganha 500 euros
    Se recusar: ganha 0 euros

    Com subsidios estilo RSI

    Se aceitar: ganha 500 euros (ordenado)
    Se recusar: ganha 100 euros (subsidio)

    Com subsidios estilo RBI:

    Se aceitar: ganha 500 euros (ordenado) + 100 euros (subsidio)
    Se recusar: ganha 100 euros (subsidio)

    Com subsidios estilo EITC:

    Se aceitar: ganha 500 euros (ordenado) + 100 euros (subsidio)
    Se recusar: ganha 0 euros

    A mim parece-me que a situação em que o trabalhador tem mais a perder se recusar um emprego é o modelo EITC, depois o modelo sem subsidio, depois o modelo RBI e finalmente o modelo RSI. Assim, creio que podemos concluir que tanto o RBI como o RSI diminuem a pressão para os trabalhadores arranjarem emprego, contribuindo para alterar a relação de forças entre o trabalho e o capital de forma relativamente mais favorável ao primeiro.

    *Isto é um simplificação, já que, no mundo real, o trabalhador normalmente não decide a quantidade de horas que vai trabalhar - é-lhe apresentada uma proposta "pegar ou largar" de "ou aceitas trabalhar X horas ou nada feito". Mas há montes de situações em que o trabalhador pode escolher, em certo ponto, a quantidade de horas de trabalho (a opção entre arranjar ou não um segundo emprego, a opção por fazer horas extraordinárias, ou mesmo as situações em que o trabalhador pode optar por trabalhar a tempo inteiro ou em part-time), o que, no agregado, levará a que um RBI reduza a oferta global de trabalho (atenção que com "oferta de trabalho" refiro-me a "trabalhadores oferencedo-se para vender a sua força de trabalho", embora na linguagem coloquial "oferta de trabalho" seja frequentemente usado ao contrário)

    [Post publicado no Vias de Facto; podem comentar lá]

    Thursday, November 14, 2013

    O ensino público e o privado

    O Rui Fonseca interroga-se porque razão o ensino superior (onde o ensino público tem melhor fama que o privado) parece funcionar ao contrário do básico e secundário (onde é o privado que tem melhor fama).

    Uma primeira explicação poderá residir no facto do ensino superior público selecionar os seus alunos (o que o torna qualitativamente diferente do básico e secundário, abertos a todos).

    No entanto, há outro factor que talvez possa contar - seria útil, quando se fala de "ensino privado", distinguir entre duas coisas diferentes: escolas privadas que, direta ou indiretamente, pertencem a pessoas, e que em principio têm por fim o lucro; e escolas privadas que pertencem a instituições, e que provavelmente visam outros fins que não o lucro (o exemplo mais típico será o das escolas ligadas à Igreja, mas talvez haja mais casos).

    Tal como o Rui nota, a Católica é uma exeção à regra da má imagem das universidades privadas, e tal não parece ser uma raridade portuguesa: p.ex., pelo que costumo ler em sites norte-americanos a "hierarquia do prestigio" das universidades norte-americanas parece-me ser, essencialmente, em primeiro lugar as universidades privadas "sem dono" (Harvard, Yale, etc., que estão organizadas sob a forma de fundações perpétuas, sendo a sua direção escolhida por um misto de representantes dos professores, dos antigos alunos e/ou de "figuras de prestígio" cooptadas - um exemplo); em segundo lugar, as universidades públicas (com as "state universities" talvez melhor vistas que os "community colleges"); e, em último, sendo frequentemente apontadas como "fábricas de diplomas", as chamadas "for-profits", as universidades privadas "como dono".

    Seria interessante se alguém pegasse nos tais rankings e fizesse um estudo tripartido, distinguindo a classificação do ensino privado "com" e "sem dono".

    Alguns números sobre a Irlanda

    Déficit público...7,3% do PIB

    Dívida púlica.....124% do PIB

    Crescimento económico em 2013....0-0,5%

    Para falar a verdade, os "fundamentais" não me parecem muito melhores que os portugueses (o que pode ter duas leituras - ou a Irlanda não está assim tão boa, ou Portugal não está assim tão mal).

    Saturday, November 09, 2013

    As "minhas" escolas no ranking

    Segundo o Expresso:

    Escola Ranking Geral Média 2013 N.º Provas %ASE Exame
    Escola Secundária Manuel Teixeira Gomes 235/
    619
    9.61/20 521 37.7 11º/12º
    Escola Secundária Poeta António Aleixo 248/
    619
    9.54/20 735 28.8
    Escola Básica D. Martinho Castelo Branco 626/
    1148
    2.68/5 287 44.7
    Escola Básica do 1º Ciclo com Jardim de Infância de Mexilhoeira da Carregação 3763/
    4621
    2.41/5 56 41.8
    Escola Básica do 1º Ciclo com Jardim de Infância Major David Neto 1424/
    4621
    2.97/5 272 42.9

    Observações:

    - Em rigor, eu andei na ESPAA do 7º ao 9º, logo deveria ter ido ver a "classificação" pelos resultados do 9º ano; mas como a ESPAA agora é só do 10º ao 12º...

    - Ao contrário do costume, a "Escola" (ESMTG) ficou à frente do "Liceu" (ESPAA)

    - O que me surpreendeu foi a percentagem de alunos cobertos pela Ação Social Escolar na Mexilhoeira da Carregação, na Major David Neto e na Martinho Castelo Branco: no meu tempo a Mexilhoeira da Carregação era uma zona extremamente desfavorecida, com uma escola largamente frequentada por filhos de operários, enquanto a Major David Neto e a Martinho Castelo Branco (então chamada simplesmente de "Ciclo") eram escolas "normais", com uma proporção de "pobres", "ricos" e "remediados" que provavelmente reflectia a na população em geral. Pelos vistos agora a Mexilhoeira da Carregação até terá menos alunos pobres do que as outras duas (embora a diferença provavelmente não seja significativa). Possivelmente a transformação, nas últimas décadas, da Mexlhoeira da Carregação num dormitório de Portimão fez com que a sua população se tornasse socialmente similar à da cidade.

    Wednesday, November 06, 2013

    Tuesday, November 05, 2013

    Anarchy

    Thursday, October 31, 2013

    Copiar a lista de links de um blogue para outro

    Na criação do Sirocco, uma dificuldade que me apareceu pela frente foi como copiar os blogrolls do Vento Sueste (claro que podia ter copiado só alguns blogs, mas isso ia dar ainda mais trabalho).

    Na net, encontrei uma semi-solução, mas não iria criar uma "lista de links" ou uma "lista de blogs", simplesmente uma sequência de código HTML, que teria que ser sempre actualizada à mão.

    No entanto, uma maneira de copiar a lista de blogues de um blog do Blogger para outro pode ser esta -  para quem use o Firefox e a extensão Greasemonkey, copiar este script:

    Novo blogue

    Entretanto, decidi criar um novo blog, o Sirocco, que consistirá simplesmente em traduções para inglês de posts do Vento Sueste que eu ache que (imodéstia?) possam interessar a um público internacional.

    Em principio no Sirocco não irá ser publicado nenhum material original.

    Uma observação - o URL acabou por ficar um bocado manhoso (http://sirocowind.blogspot.com/, misturando grafia olhanense e língua inglesa), porque quase todos os endereços que tentei já estavam ocupados, quase sem excepção por blogs de um post... (vamos lá ver se este chega a ter mais).

    As "escolas independentes geridas por comunidades de professores"

    Os defensores da "gestão democrática das escolas" e críticos dos directores impostos pelo Ministério não deveriam ser a favor?

    Saturday, October 26, 2013

    Sintomas de más criticas aos economistas

    18 signs you’re reading bad criticism of economics, por Chris Auld:

     Here, then, are some symptoms of bad critiques of economics:
    1. Treats macroeconomic forecasting as the major or only goal of economic analysis.
    2. Frames critique in terms of politics, most commonly the claim that economists are market fundamentalists.
    3. Uses “neoclassical” as if it refers to a political philosophy, set of policy prescriptions, or actual economies. Bonus: spells it “neo-classical” or “Neo-classical.”
    4. Refers to “the” neoclassical model or otherwise suggests all of economic thought is contained in Walras (1874).
    5. Uses “neoclassical economics” and “mainstream economics” interchangeably. Bonus: uses “neoliberal economics” interchangeably with either.
    6. Uses the word “neoliberal” for any reason.
    7. Refers to “corporate masters” or otherwise implies economists are shills for the wealthy or corporations.
    8. Claims economists think people are always rational.
    9. Claims financial crisis disproved mainstream economics.
    10. Explicitly claims that economics is not empirical, or does so implicitly by ignoring empirical economics.
    11. Treats all of economics as if it’s battling schools of macroeconomics.
    12. Misconstrues jargon: “rational.”
    13. Misconstrues jargon: “efficient” (financial sense) or “efficient” (Pareto sense).
    14. Misconstrues jargon: “externality“.
    15. Claims economists only care about money.
    16. Claims economists ignore the environment. Variant: claims economics falters on point that “infinite growth on a finite planet is impossible.”
    17. Goes out of its way to point out that the Economics Nobel is not a real Nobel.
    18. Cites Debunking Economics.

    Thursday, October 24, 2013

    Os vários tons dos ciganos

    The Roma have multitudes, por Razib Khan:

    There was a recent case in Ireland of a young Roma girl who was blonde haired and blue eyed being removed from her home, on the suspicion that she was not in fact the biological child of the presumed parents (who, like most Roma, are reportedly of dark complexion, hair, and eye). I even saw a report that a hospital was consulted on the probability of such an outcome, and they said it would be “extremely unusual”. It turns out that DNA tests confirmed that this girl was the biological child of the putative parents. And of course all this has be understood in light of the case of “Maria” in Greece; a little blonde girl who turned out not to be the biological child of the two Roma who claimed her as their daughter (it looks like there was welfare fraud in that case).

    My initial response to the Irish case was that consultant should be fired, because in an admixed population like the Roma it shouldn’t be that unusual to have offspring who deviate a great deal from the parental phenotype. This prompted some interesting reactions. First, there were those who seem blissfully ignorant of the fact that the Roma are an admixed population. That’s easy enough to resolve, as there have been scientific papers published on this issue using genome-wide data. Second, there are claims that very small fraction of Roma have blonde hair and blue eyes (on the order of less than 1%). The latter may be a defensible claim, though not indisputably so.

    Wednesday, October 23, 2013

    A Irlanda não é a Grécia

    Ireland Shocked As DNA Test Shows Blonde Girl Taken From Roma Family To Be Their Daughter, no Business Insider.

    Direitos fundamentais não se referendam?

    A respeito da proposta da JSD de levar a referendo a co-adopção e a adopção por casais homossexuais, Isabel Moreira terá dito que "[r]eferendar direitos fundamentais é a negação da democracia".

    Essa conversa de que "direitos fundamentais não se referendam" é recorrente quando se fala de referendos sobre certos assuntos, mas não me parece fazer grande sentido, por duas razões:

    Em primeiro lugar, parece-me que, se "direitos fundamentais não se referendam", então isso também significaria que "direitos fundamentais não se votam na Assembleia da República"; afinal, se admitirmos que há certos princípios que estão acima da vontade popular, então a legitimidade dos representantes do povo para decidir sobre eles é tão nula como a do povo em pessoa (afinal, a autoridade dos deputados é supostos ser concedida pelo povo, através da eleição; logo, se o povo não tem autoridade para decidir sobre certos assuntos, também não pode delegar essa autoridade - inexistente - em ninguém). Nessa perspectiva, perante uma lei que violasse "direitos fundamentais", só haveria uma atitude possivel - a desobediência civil pura e dura.

    Em segundo, a posição que "direitos fundamentais não se referendam" tornaria na prática quase impossível qualquer referendo, já que quase todas as questões politicas mexem nalguma coisa que alguém algures considera "direitos fundamentais".

    Nota - se o referendo proposto fosse para frente, o meu voto seria de certeza "sim" à primeira pergunta e provavelmente também "sim" à segunda.

    Monday, October 21, 2013

    "Hackers" vs "fatos"

    Hackers vs. suits: Why nerds become leakers, por Timothy B. Lee (Washington Post):

    When The Guardian unveiled its profile of Edward Snowden, it included a picture of the 29-year-old contractor with his laptop. On its back were stickers for the Electronic Frontier Foundation, a digital civil liberties group, and Tor, software that allows people to browse the Internet anonymously.

    Laptops with EFF or Tor stickers are common at technology conferences, and people who have them tend to have a lot in common. They tend to be technically-savvy, skeptical of authority, and comfortable defying social conventions. Like Snowden, a high school dropout, they tend to have unconventional career paths.
    These personality traits describe Bradley Manning, the young soldier who is accused of leaking secret documents to the WikiLeaks Web site. They also describe WikiLeaks founder Julian Assange. And that probably isn't a coincidence.

    The Silicon Valley investor Paul Graham has argued that the same personality traits that make people good at programming also cause them to have a disobedient attitude toward authority figures and social conventions. These programmers, who often describe themselves as hackers, are experts at examining complex systems and finding ways to make them work better. They tend to think about society as just another complex system in need of optimization, and this sometimes leads them to conclusions starkly at odds with conventional wisdom. (...)

    Obviously, hackers' curiosity and penchant for unconventional thinking can create tensions with authority figures, who hackers derisively refer to as "suits." They are sometimes viewed as prickly loners, and may not observe the social niceties that make offices function smoothly. But while hackers' disobedient tendencies give bosses heartburn, organizations can't get along without them. Their intellectual curiosity and knack for finding creative solutions to hard technical problems make them indispensable.

    A estrutura remuneratória da função pública

    [Regressando e aprofundando este tema]

    No Relatório [pdf] do Orçamento de Estado proposto, o alargamento dos cortes salariais é justificado com o seguinte argumento (página 32)..

    Refira-se que a redução do limite inferior, a partir do qual as medidas são aplicáveis, teve o único propósito de, mantendo embora a isenção absoluta dos rendimentos ilíquidos inferiores a 600 euros, dirimir uma inadequada política de rendimentos na Administração Pública. Com efeito, o estudo solicitado pelo Governo a uma consultora internacional demonstra que as práticas salariais da Administração Pública diferem substancialmente do padrão que é observado no sector privado, sugerindo um padrão de iniquidade entre o público e o privado. Depreende-se que no sector público existe um prémio salarial superior para funções de menor exigência e/ou responsabilidade e que as remunerações associadas a funções de maior complexidade e exigência tenderão a ser inferiores às do sector privado. Também recentemente a OCDE reconheceu a existência de um elevado diferencial entre salários no sector privado e salários no sector público.

    [Via Pedro Romano]
    O estudo deve ser este, "Análise Comparativa das Remunerações Praticadas no Sector Público e no Sector Privado" [pdf], da consultora Mercer, publicado em fevereiro de 2013.

    E, realmente, lá há uma passagem (página 3), em que pode ser lido:
    Em termos gerais, conclui-se que as práticas salariais da Administração Pública diferem do padrão que é observado no sector privado, podendo assumir-se que, no sector público, existe uma prática salarial superior para funções de menor exigência e/ou responsabilidade e que as remunerações pagas para funções de maior complexidade e exigência tenderão a ser inferiores às do sector privado.
    Mas creio que esta passagem ganha um outro significado se for lida no contexto geral:
    Em termos gerais, conclui-se que as práticas salariais da Administração Pública diferem do padrão que é observado no sector privado, podendo assumir-se que, no sector público, existe uma prática salarial superior para funções de menor exigência e/ou responsabilidade e que as remunerações pagas para funções de maior complexidade e exigência tenderão a ser inferiores às do sector privado. Todavia, esta análise macro não dispensa uma apreciação mais analítica por tipo de função/profissão, que este relatório apresenta.

    Para funções de topo (direcção superior de 1.º e 2.º nível) verifica-se que as remunerações (ganho) praticadas no sector privado poderão exceder, em média, cerca de 30% as praticadas no sector público. Ao nível das funções de direcção intermédia, constata-se que o sector privado tende ainda a ser mais competitivo em termos remuneratórios que o sector público, embora com um diferencial menor e que se tende a esbater (ou mesmo a reverter) quando se desce na hierarquia e nos níveis de responsabilidade atribuídos.

    Ao nível das funções técnicas (v.g. Técnico Superior e Informático) constata-se que a média salarial praticada na Administração Pública excede, ainda que de forma moderada, a que é praticada no sector privado, identificando-se um diferencial salarial que poderá chegar, em média, aos 14%. Importa, todavia, ter presente que este estudo não entrou em consideração com componentes remuneratórias de natureza variável, que tendem a assumir alguma expressão no sector privado.

    O factor antiguidade de serviço será também relevante para justificar as diferenças encontradas ao nível da carreira técnica superior, porquanto no sector público esta variável é muito determinante para a construção da remuneração mensal auferida, o que não acontece de forma tão vincada no sector privado.

    Relativamente ao grupo dos assistentes técnicos e demais pessoal administrativo, que é extremamente heterogéneo no sector público, verifica-se que a diferença em termos salariais face ao sector privado é reduzida, embora ainda ligeiramente favorável ao primeiro.

    Para as funções de assistentes operacionais e auxiliares, que assumem uma grande dimensão no conjunto da Administração Pública ao contrário do que, em geral, se verifica no sector privado observado, constata-se que as remunerações praticadas no sector público tendem a ser ligeiramente inferiores às do sector privado. Importa, contudo, ter em consideração que a utilização deste tipo de trabalhadores no sector privado tende a estar associada a funções de carácter produtivo e/ou operacional, sobretudo em empresas de pendor industrial, e no sector público está maioritariamente associado a tarefas administrativas e/ou auxiliares, normalmente não inseridas na cadeia de valor produtiva da organização, sem prejuízo do papel relevante que possam desempenhar.
    Isto é, quem leio, não só a proposta do Orçamento, mas sobretudo muitos artigos de jornal que se têm publicado nos últimos tempos sobre os salários da função pública, fica com a ideia que profissionais mais qualificados são mal pagos na administração pública e os pouco qualificados bem pagos; quando na verdade os profissionais menos qualificados ganham na AP largamente o mesmo que no privado, sendo as grandes diferenças dentro do grupo dos "mais qualificados” - com os “dirigentes” a ganharem mal em comparação com o privado e os “especialistas” a ganharem aparentemente bem (deixando de lado a tal questão das remunerações variáveis...).

    Ora, creio que isto muda muito os termos com que a questão é geralmente posta.

    P.ex., o programa de rescisões "voluntárias", destinado a Assistentes Técnicos (empregados administrativos) e Assistentes Operacionais (operários) - creio que nenhum membro do governo, ao lançar esse programa, veio com a conversa de que esses grupos eram comparativamente bem pagos na função pública; mas muitos jornais disseram isso (lembro-me perfeitamente de o artigo no Expresso sobre o programa de rescisões dizer isso), deixando implicito que era um dos motivos para as rescisões serem dirigidas a esses grupos.

    Mas o ponto mais importante é que se dá uma imagem distorcida da "luta de classes" em causa - a conversa habitual dá a ideia que é uma questão de distribuição de rendimento entre trabalhadores com menos e com mais qualificações. E, infelizmente, a ideia de que é expectável (e se calhar até desejável...) uma grande desigualdade de rendimentos entre as pessoas conforme o seu nível de qualificações parece ter assentado arraiais na nossa sociedade (frequentemente as mudanças tecnológicas costumam ser apresentadas como a causa disso, mas acho essa tese muito fraquinha), pelo que a conversa de que é desejável aumentar a desigualdade salarial na função pública até consegue passar sem grande resistência. Já dizer abertamente de que é preciso baixar os vencimentos aos "especialistas" e subir aos "dirigentes" seria mostrar demasiado o jogo e assumir que a luta pela repartição do rendimento não é entre menos e mais qualificados, mas sim entre os "dirigentes" e o resto; e atendendo à indignação que no mundo ocidental tem vindo a crescer contra as elevadas remuneração dos gestores, se calhar um discurso dizendo "temos que subir os salários dos dirigentes e baixar os dos técnicos para estarmos em linha com o privado" talvez provocasse uma resposta "não será o privado que está mal?" (e, já agora, haveria também a resistência motivada pela convicção dominante - seja ela fundada ou infundada - de que grande parte dos dirigentes na administração pública são-no mais por ligações políticas do que por competência profissional).

    [Post publicado no Vias de Facto; podem comentar lá]

    Monday, October 14, 2013

    A "hipotese da eficiência dos mercado" - reloaded

    Na sequência da atribuição do Prémio "Nobel" da Economia a Eugene Fama e mais uns quantos, re-posto isto que escrevi há dois anos sobre o "mercado eficiente":

    Uma teoria económico que me parece frequentemente mal interpretada é a chamada "hipótese do mercado eficiente".

    Em que consiste essa teoria? Basicamente, que o preço de um activo financeiro num dado momento reflecte toda a informação disponível nesse momento sobre esse activo; a ideia é que qualquer "bom negócio" que surja desaparece em poucos instantes (talvez numa questão de minutos ou segundos), já que os investidores, ao saberem disso, vão investir nesse titulo, fazendo subir o seu preço e , portanto, deixa de ser um "bom negoócio"; p.ex., mal se sabe que uma empresa descobriu petróleo, o preço das suas acções sobe nesse preciso momento, fazendo com que esse investimento deixe de ser especialmente rentável (apenas durante uma fracção muito escassa de tempo é que alguém pode ganhar dinheiro na bolsa com isso, talvez apenas a primeira pessoa a ter ouvido a noticia "a Gasosas & Gasolinas, Lda. descobriu petróleo na Praia da Rocha"). Ou seja, a HME sustenta que, se uma acção (ou outro investimento qualquer; vou falar em "acções" por comodidade) estivesse barata face às suas perspectivas de rentabilidade e risco esperadas, já alguém a teria comprado, fazendo subir o seu preço (mutatis mutandis para "cara") - por isso, o preço das acções deve reflectir exactamente o que se sabe sobre a sua potencial rentabilidade.

    Uma metáfora clássica dada para ilustrar a HME é de que não há notas de 50 euros (bem, a metáfora costuma ser com dólares...) na calçada - se houvesse, já alguém as teria visto e apanhado.

    Agora, vamos ao equívoco que me parece comum na interpretação do que é a HME (ver, p.ex., alguns comentários a este post d'O Insurgente) - o "eficiente" aqui significa apenas "eficiente a traduzir a informação disponível em preços"; não tem nada a ver com "eficiente a garantir o bem-estar económico e social" - os mercados podem dar origem a crashs, recessões, desemprego em massa, poluição, etc., etc. que não é por isso que deixam de ser "eficientes" no sentido específico que a HME dá à palavra (dizer "a crise de 1929/1987/2000/2008/etc. deita por terra a hipótese do mercado eficiente" é um pouco como dizer "como é que alguém pode defender a família nuclear depois de Three Mile Island, Chernobil e Fukushima?") .

    A HME tem algumas implicações:

    - Uma é que só por sorte se pode fazer "bons negócios"; em média, investir em mercados como a bolsa dará um rendimento que só será maior do que, p.ex., um depósito a prazo para compensar o investidor do risco corrido (bem, não sei bem se isto é um implicação da HME ou se é apenas a HME explicada por outras palavras)

    - A mais conhecida é a do "caminho aleatório", de que a evolução futura do preço de um título é imprevisível. A ideia é de que, se o preço actual de um título já reflecte toda a informação disponível, o preço só será afectado por nova informação ainda desconhecida. Como a informação futura é, por definição, actualmente desconhecida, é impossível prever como o preço do título vai evoluir ao longo do tempo - essa evolução vai forçosamente ser aleatória e imprevisível (um ponto fundamental para perceber a diferença entra a HME e o que normalmente se entende por "eficiência" - à partida soa algo contra-intuitivo chamar "eficiente" a um mercado aleatório e imprevisível)

    - Outra poderá ser a de que a chamada "gestão passiva" (isto é, uma estratégia de investimentos que se limita a seguir uma regra pre-estabelecida - estilo "ter uma carteira com uma composição idêntica à do PSI20" - em vez de activamente escolher onde investir e tentar fazer previsões) pode ser mais rentável que a "gestão activa": afinal, se só por sorte se consegue fazer "bons negócios", mais vale seguir uma regra pré-estabelecida do que estar a pagar a gestores, analistas, etc. para tentar descobrir como o mercado vai evoluir (mesmo que a rentabilidade antes de despesas seja um bocadinho menor, é compensado com o que se poupa em salários, comissões e prémios de desempenho)

    - numa linha semelhantes (ou talvez isto seja um subponto do ponto anterior), que escolher onde investir jogando dardos para um lista de títulos e comprar os escolhidos tenderá a dar os mesmos ou melhores resultados do que contratar especialistas (o raciocínio é o mesmo; é impossivel prever como vai evoluir o mercado, e pelo menos assim poupa-se dinheiro em comissões)

    - que tanto faz entregar a gestão dos nossos investimentos no mercado de capitais a analistas com um MBA, uma pós-graduação em Matemáticas Avançadas e uma licenciatura em Economia ou a uma gata siamesa; afinal, é impossível prever como as acções vão evoluir, e os custos de manutenção do felino até são menores (de novo, poupa-se dinheiro em comissões)

    - ocorre-me também que a HME pode implicar que cobrar impostos altos aos trabalhadores da banca de investimentos pode aumentar a eficiência (no sentido usual da palavra) da economia - o meu raciocinio: em termos globais, pouco diferença faz as empresas do ramo terem super-génios ou super-trabalhadores ou apenas pessoas ligeiramente acima da média; cada empresa individual pode ter interesse em ter os melhores trabalhadores (isso pode fazer a diferença de segundos que permite ser a empresa A em vez da B a fazer um bom negócio antes que ele desapareça), mas para a indústria no seu todo pouco diferença fará ter trabalhadores altamente produtivos em vez de apenas medianamente produtivos (o mercado pode ser uns segundos mais rápido a identificar - e eliminar - bons negócios, mas isso mal se notará no conjunto da economia, ou mesmo para os lucros do conjunto das empresas de investimento); e esses impostos altos, ao desencorajar os trabalhadores potencialmente mais produtivos de ir trabalhar para os mercados bolsistas, iriam levá-los a ir trabalhar para áreas onde as suas capacidades efectivamente façam uma diferença relevante (em vez de serem utilizadas num jogo de soma quase nula). Admito que na prática seria provavelmente díficil (ou quase impossível) aplicar impostos específicos a ramos empresariais específicos.

    [penso que as duas últimas "implicações" não aparecem em nenhum manual de economia - embora alguns textos falem de babuínos - mas parecem-me conclusões lógicas da HME]

    Uma nota final - a HME não poderá ser uma profecia auto-destruída? Afinal, a ideia é que, como há centenas/milhares/dezenas de milhares de investidores à cata de bons negócios, qualquer bom negócio que exista será imediatamente identificado e deixará de existir. Mas se os investidores agirem de acordo com a HME, não irão perder tempo à procura de bons negócios (limitar-se-ão em investir em fundos passivos, ou seguir os conselhos de investimento dos seus gatos), logo as tais potenciais oportunidades de bons negócios não serão identificadas, haverão muitas possibilidades de ganhar dinheiro não-aproveitadas, e os preços acabarão por não reflectir toda a informação disponível (mas talvez a HME tenha implícito a premissa que haverá sempre um núcleo considerável de pessoas que não vai investir de acordo com a HME, tal como as teorias que dizem que votar é irracional têm implícita a ideia que haverá sempre muita gente a votar).

    Friday, September 27, 2013

    As minhas previsões para Portimão

    PS - 3
    CDS - 2
    PSD - 1
    BE - 1

    Monday, September 23, 2013

    Esclarecimento da CNE sobre a propaganda por e-mail

    Ainda acerca deste assunto, a CNE enviou-me a seguinte informação:

    Exmo. Senhor

    Em resposta ao pedido de esclarecimento de V. Exa., informo que o seguinte:

    A propaganda eleitoral consiste na atividade de promoção de ideias, opções ou candidaturas políticas e baseia-se nas ações de natureza política desenvolvidas pelos candidatos, seus apoiantes e mandatários ou representantes destinadas a influir sobre os eleitores, de modo a obter a sua adesão às candidaturas e, em consequência, a conquistar o seu voto.

    Conforme resulta do seu enquadramento legal, a atividade de propaganda político-partidária, tenha ou não cariz eleitoral, seja qual for o meio utilizado, é livre e pode ser desenvolvida, fora ou dentro dos períodos de campanha, com ressalva das proibições e limitações expressamente previstas na lei.

    O envio de propaganda através de correio eletrónico não configura violação à lei eleitoral.

    Todavia, pode colocar-se a questão da admissibilidade do envio de mensagens de propaganda política ou eleitoral através de correio eletrónico, sem que tal situação tenha sido autorizada pelo seu destinatário, titular do endereço de correio eletrónico, cuja apreciação cabe à Comissão Nacional de Protecção de Dados (Rua de São Bento nº 148-3º 1200-821 Lisboa, Tel: 213928400, Fax: 213976832, e-mail: geral@cnpd.pt).

    Tuesday, September 17, 2013

    A CNE proibiu a propaganda por e-mail?

    Parece ter-se tornada "senso comum" de que a Comissão Nacional de Eleições terá proibido o envio de propaganda eleitoral por e-mail, informação que é repetida em toda a parte (exemplo A; exemplo B).

    Mas será mesmo assim? Sinceramente, e sem querer parecer muito arrogante, acho que está toda a gente enganada - pelo menos indo ao site da CNE não me parece haver nada proibindo o uso de e-mails.

    O que há é uma resolução da CNE intitulada "Utilização de novos meios de publicidade comercial" dizendo:

    A propaganda eleitoral através de "infomail" e centros de contacto telefónico está abrangida pela proibição de utilização de meios de publicidade comercial (artigo 46.º da LEOAL).

    Por deliberação desta data, a CNE entendeu também que se aplica à utilização destes meios a exceção prevista na lei para a imprensa, com as devidas adaptações, podendo, portanto, através deles serem divulgadas iniciativas de campanha específicas, desde que essa divulgação se limite a identificar a candidatura, a iniciativa, a data, a hora e o local da sua realização e os participantes, se for o caso.
    Para quem não sabe, o Infomail é um serviço pago dos CTT de distribuição de propaganda ao domicilio - não tem nada a ver com e-mails. O que pelos vistos se passou é que algum estagiário da Lusa leu o comunicado da CNE, pelos vistos julgou que "Infomail" queria dizer "e-mail" (um pouco como aquelas pessoas que julgam que "Martin Luther" é o Martin Luther King) e fez uma noticia com o titulo de que a CNE tinha probido a propaganda por e-mail e por SMS.

    Mas se lermos todas as noticias publicadas sobre o assunto, têm uma estrutura igual (por isso é que eu acho que devem ter sido copiadas de alguma nota da Lusa):

    Título - CNE proíbe propaganda política por telefone e e-mail

    Corpo da noticia - A Comissão Nacional de Eleições (CNE) proibiu hoje propaganda eleitoral por "infomail" e centros de contactos telefónicos, depois de ter recebido várias queixas de cidadãos a propósito de candidaturas autárquicas no Porto e Braga.


    Ou seja, as próprias notícias que têm como título a alegada proibição dos e-mails, no texto falam é da proibição do "Infomail".

    Aliás, que lógica tinha proibir o e-mails se é um meio de comunicação gratuito (logo não pode ser considerado publicidade comercial) e ao alcance de todas as candidaturas, seja quais forem os seus meios económicos?

    Nota - se alguém me apresentar uma resolução da CNE proibindo efectivamente o uso de correio electrónico estou disponível para alterar este post.