Sunday, September 28, 2008

O "Magalhães"

Várias polémicas têm surgido à volta do computador "Magalhães". Algumas fazem todo o sentido, como a questão de não passar do nome local de um tipo de computador que já é usado em grande parte do mundo, e de ser tão de "fabrico nacional" como qualquer computador que seja montado por um técnico na loja.

Mas outras objecções/polémicas parecem-me um bocado fraquinhas:

- A questão do "controlo parental": na verdade eu suspeito que os ideólogos do "Magalhães" nem se lembraram de tal coisa; mas, se ele viesse já configurado, aí meu Deus, que era o totalitário nanny state que vinha aí! E se alguém respondesse que os pais poderiam alterar as configurações, a resposta seria algo como "Quantos pais destes alunos têm conhecimentos suficientes para garantir esta correcta parametrização? 1%? Menos?".

Já agora (isto é uma questão para quem saiba mais do que eu), o chamado "controlo parental" serve para alguma coisa ou é um "tigre de papel"? Por exemplo, se o computador tiver instalado outro browser que não o IE, as protecções do Windows servem para alguma coisa? E, se em vez da versão Windows, o "Magalhães" estiver a funcionar com a versão Linux? Há algum "controlo parental" aí (isto não são perguntas de retórica; são mesmo perguntas)? Alguém poderá comentar "Estamos a falar de miúdos da escola primária!", mas não os subestimem.

- "O computador só é útil é se haver alguêm que ensine à criança como mexer com ele". Quando tinha 11 anos, ninguém me ensinou a mexer no ZX Spectrum (excluindo um livrinho de instruções da "Colecção Cultura e Tempos Livres"), o que acho que encerra a discussão sobre esse ponto. De novo, pode-se argumentar que isso não vale para miúdos da primária, mas acho que vale: por um lado, devido ao efeito Flynn; por outro (ou pelo mesmo?), os meus sobrinhos (8 anos) aprendem num instante como funcionam os jogos novos da Playstation (e o mecanismo mental para perceber como um jogo funciona é o mesmo que é necessário para perceber como uma aplicação "útil" funciona) e já descobriram funcionalidades no computador que eu nem sequer sabia que existiam (por exemplo, um dos meus sobrinhos sabe como fazer o rato deixar rasto, coisa que eu tive uma trabalheira para descobrir como se desliga).

"Um outro equívoco frequente é pensar que a familiarização com o uso de uma tecnologia propicia o progresso tecnológico de toda uma população no sentido do domínio e produção dessa tecnologia. Nesta linha de pensamento, dar automóveis a toda a gente criaria o caldo de cultura necessário para o país vir a ter uma grande indústria de automóveis" - esta foi copiada de um comentador do Abrupto; penso que o João Miranda também tinha escrito algo parecido num dos seus artigos no DN.

Há uma diferença (pensando melhor, duas diferenças) importante entre um computador e um automóvel: um automóvel (tal como um fogão ou uma lanterna) é um dispositivo apenas para se usar - é suposto ser raro os condutores irem mexer no motor (eu conheço pelo menos uma pessoa que adora estudar e fazer experiências com os mecanismos do seu carro, mas é uma excepção); já o computador presta-se mais a "mexer no motor": há todo um conjunto de coisas que se podem fazer com um computador, desde instalar um programa, passando por alterar parâmetros de alguma configuração, fazer "macros", fazer ficheiros "batch", até fazer programas mesmo, em que o utilizador deixa de ser um mero "utilizador" para se tornar, em parte, um "criador" (como escrevi, até instalar uma nova aplicação já implica não ser um mero "utilizador").

Ou seja, uma pessoa mexendo num computador aprende mais sobre seu o mecanismo de funcionamento do computador do que mexendo num carro.

Até é possível que a quantidade de pessoas com vocação para programador informático seja pouca, mas mesmo assim a massificação do computador contribui para aumentar a quantidade de possíveis programadores e afins: vamos imaginar que 10% da população tem um perfil intelectual e psicológico compativel com se dedicar à programação ou actividades afins; numa sociedade em que apenas 30% das pessoas tenham acesso a computadores, teremos 3% de possíveis programadores; numa em que 70% tenham computador, teremos 7% de possíveis programadores.

Agora a segunda diferença - é que mesmo que muita gente adorasse "brincar" com os motores do carro, fazer "tunning" ou coisas do género, e, com isso, se tornassem peritos em mecânica automóvel, isso por si só não serviria de base a uma indústria automóvel, já que uma fábrica de automóveis não é algo que um grupo de amigos que até percebe do assunto possa montar no quintal - a indústria automóvel (e grande parte das indústrias) exige grandes investimentos de base, muitos empregados, etc. Além disso, imagino que a maioria dos trabalhadores de uma fábrica de automóveis não precisem de ter grandes conhecimentos sobre mecânica automóvel (há pelo menos um blogger que trabalha numa fábrica de automóveis - Daniel Arruda do Troll Urbano; não sei se ele concordará com o que escrevi), ao contrário dos trabalhadores de uma empresa de software informático (já não digo uma de hardware).

Ou seja, ou contrário da maior parte dos produtos, a expansão da posse de computadores contribui para a expansão do número de pessoas que percebem de computadores; e haver muita gente a perceber de computadores contribui muito mais para o desenvolvimento de uma indústria informática do que na maior parte dos outros produtos (como automóveis ou televisões, em que haver muita ou pouca gente a perceber como eles funcionam é menos relevante para o aparecimento de uma industria).

1 comment:

Anonymous said...

que eu saiba o controlo pode ser feito indo ao aplicativo opçoes da internet, e no meu browser posso bloquear eventualmente paginas.
no entanto o aplicativo opçoes da internet está ligado a um sistema de avaliaçao feito por uma entidade qualquer.
de resto posso bloquear palavras estilo nuas ou lesbicas..

no entanto nao é muito eficaz se um menor escolher por exemplo a palavra "gatas".