Thursday, July 24, 2008

Problema de terminologia?

No Spectrum fala-se do artigo de Nuno Teles e João Rodrigues no Le Monde Diplomatique:


Não haverá aqui um problema terminológico (se calhar responsável por grande parte das polémicas entre os Ladrões de Bicicletas e, p.ex, O Insurgente)?

Ou seja, aquilo a que nós na esquerda chamamos "neo-liberalismo" não é aquilo a que os liberais chamam "liberalismo", o que torna, p.ex., discussões sobre se a crise financeira é culpa do "neo-liberalismo" um bocado conversas de surdos.

22 comments:

NC said...

Brilhante!

Clap! Clap!

Anonymous said...

Exatamente. Liberalismo é uma teoria política, que nada tem a ver com o "neoliberalismo" que os esquerdistas gostam de insultar.

Luís Lavoura

Anonymous said...

O mesmo raciocinio aplica-se ao que os liberais chamam de socialismo não?
São determinadas características da nossa organização social, "mais liberais" ou "mais socialistas" que estão constantemente em discussão, não o modelo geral que é apelidado de ambos os lados como sendo absolutamente contrário às suas crenças. Em todo o caso na maioria das vezes o que está em causa são apenas signos políticos, como por exemplo se depreende do apoio a certos políticos ou países que não fazem mais ou menos do que se passa actualmente em Portugal ou em inglaterra para dar 2 exemplos dos pretensos antipodas.
No entanto há que notar um recuo de determinadas caracteristicas ditas socialistas da nossa sociedade , do discurso, e mesmo dos próprios partidos socialistas.

Miguel Madeira said...

"O mesmo raciocinio aplica-se ao que os liberais chamam de socialismo não?"

Sim.

Quando escrevi o post até tinha incluido uma passagem vagamente sobre isso, mas depois achei melhor deixá-la em rascunho para eventualmente fazer um post autónomo (se me apetecer).

Anonymous said...

nesse caso ha uma dúvida que me aflora também. As criticas ao comunismo, são moormente à aplicação prática do comunismo certo. Ou melhor à sua não aplicabilidade sem degenerar. Então porque é que não se associa o liberalismo à aplicação liberal do final do sec. XIX que como sabemos também teve imensos problemas. Será que a conjuntura só vale para um?

Anonymous said...

Depois, haverá muitos que questionarão se houve mesmo uma "aplicação liberal" no final do sec. XIX, e, a haver, se suscitou os tais "imensos problemas".

Anonymous said...

Filipe abrantes, para não cairmos em espiral no relativismo sem fim basta que adoptemos o mesmo critério de análise para ambas as situações não pensa?

Anonymous said...

ora se a maioria das criticas ao comunismo tem menos a ver com a praxis digamos(muitas vezes nada comunista) do que com a assumpção auto identificadora de ser comunista, entao temos panos para mangas para falar de liberalismo no sec XIX/XX.

Anonymous said...

"Filipe abrantes, para não cairmos em espiral no relativismo sem fim basta que adoptemos o mesmo critério de análise para ambas as situações não pensa?"

Acho. Mas foi o ferro quem na mesma frase disse que se criticava injustamente a praxis do comunismo, cometendo exactamente a mesma "injustiça" dizendo que um suposto liberalismo do séc. teve imensos problemas. Só quis balancear as coisas. Pois penso que o ponto do post é esse mesmo.

Anonymous said...

não, apenas constatei o facto de não parecer existir essa auto-critica ao contrário do que sucede com o comunismo, apresentando-se o liberalismo quase como que uma utopia imaculada.

Anonymous said...

já agora não acham curioso que se à presença soviética que funcionava como pressão digamos social e sobre ela se construiu muito da social democracia em que vivemos, hoje em dia se contrapõe a presença chinesa supostamente também um país socialista mas exactamente nos termos inversos. Ou seja para desatar certas conquistas sociais.

Anonymous said...

voltando ao tema inicial. Ambas as criticas dirigem-se ao regime actual tal como o conhecemos. Ora não se pode afirmar em verdade que o "liberalismo social" ou o "socialismo liberal" em que vivemos no ocidente tenha falhado. Isso seria também dar um tiro no pé. Pode é haver nuances com mais ou menos sucesso conforme as perspectivas. Logo para reforçar o seu ponto de vista cada um dos lados produz uma abstracção não real da situação que existe. Constroi uma caricatura reajustável do outro? Seja o "neoliberalismo" ou o "socialismo"?

xatoo said...

Vamos lá tentar pôr um pouco de ordem na crítica ao “liberalismo” e ao “socialismo”
Se é verdade que o primeiro evoluiu para “neo-liberalismo” e o segundo para “neo-socialismo” (se atendermos à vulgata da experiência de capitalismo de Estado na URSS que a tenta identificar como socialista, embora tivesse segregado a participação das bases), é sempre necessário levar em linha de conta a expressão de Marx que fundamenta a evolução da ideologia como assentando e derivando da macro estrutura económica que a suporta. Assim, existem na filosofia marxista premissas inesgotáveis para prosseguir numa 3ª via. Ainda ontem numa gravação do canal Parlamento, na audição ao Vítor Constâncio (leia-se BP/BCE/FED, isto é a tal macro-estrutura económica), ouvi um patusco economista do PS sugerir que “se até aqui houve liberdade para privatizar tudo, num ciclo descendente deveria haver também liberdade para voltar a nacionalizar”, pelo menos o essencial, para evitar o descalabro social. Ao advogar a existência de um sector colectivo que zele pelos bens essenciais da comunidade, o homem é marxista sem o saber. A grande questão em relação aos homens dos aparelhos da partidocracia volta sempre ao ponto de partida: o da participação democrática

Anonymous said...

xatoo eu acho que não se pode ser tão linear. O próprio liberalismo républicano era de esquerda no sec. XIX. Depois evoluiu para um liberalismo imperialista/mercantilista. Foi uma transformação derivada de digamos o projecto de poder. Mas os conservadores não eram particularmente afectos ao liberalismo e não tenho dúvidas de que lado estariam os nossos "liberais" de hoje em meados do sec XIX. O legado digamos liberal foi sendo apropriado pelos republicanos e pelos socialistas.

Anonymous said...

para ter este tipo de discussões é necessario haver uma linguagem comum, terminologias aceites por todas as partes. caso contrairo a conversa começa a dispersar-se e a tornar-se uma conversa de surdos.

pois, os termos socialista e liberal hoje são diferentes dos termos usados inicialmente.

na minha optica o neo liberalismo perdeu tudo o que era de liberal, alias penso ser um contrasenso tendo em conta os primordios do movimento liberal.

deem lhe outro nome ao "neo liberalismo", "ultra capitalismo" ou "seita da mao invisivel do ultimo dia".

Anonymous said...

«deem lhe outro nome ao "neo liberalismo", "ultra capitalismo" ou "seita da mao invisivel do ultimo dia".»

Muitos (mal ou bem) chamam-lhe "estatismo" ou "socialismo".

Acho que as conversas se tornam mais claras quando se deixa de falar em "liberalismo" ou "socialismo" (embora seja quase irresistível), para passar a falar em "estado" (todos sabemos o que é e o que faz), em "governo" (idem) ou em "população A" ou em "população B". Os nomes são convenções, agora referem-se a coisas concretas. Tipo: "terrorismo" é arrasar Nagasaki, conspirar para matar ditadores ou ser homem-bomba em Jerusalém?

Sendo que o "mal" é "subjectivo" (consoante o lado da barricada), não teremos de procurar uma "verdade" além do que é percepcionado por ambos os lados (os liberais falam do "direito natural", por exemplo)?

[bolas, isto quase parece um post à Henrique Raposo, acho que estou no bom caminho]

Anonymous said...

mas o direito natural tem uma conjuntura muito especifica. Apareceu em contraposição ao direito divino e ao medievalismo servil. O direito natural foi consagrado com a républica. Agora, será que a solução se esgota no direito natural num mundo como o nosso? O que resulta do sistema actual é as pessoas serem tratadas como massas disformes, não como individuos e com direitos pouco claros. Por outro lado muitos dos abusos que existiam na época de hobbes e locke continuam a existir com outras roupagens legalissimas.

xatoo said...

precisamente, falar em "Estado" é o que liberais e "socialistas" fazem - advogam duas formas de o controlar; mas a ideia marxista de Socialismo é, recorde-se, a de acabar com o Estado - tem de ser criado outro tipo de instituições democráticas com controlo de proximidade. Basta de revisionismos!. Podemos votar caso a caso pela internete, nas juntas de freguesia, autarquias, questões nacionais, etc; para que é que precisamos daquele bando assalariado de pançudos em São Bento?

Anonymous said...

talvez faça algum sentido falar em esquerda e direita, visto que como demonstramos outras etimologias assumem diferentes roupagens, transfiguram-se. Os liberais já foram de esquerda, os monarquicos de direita, agora há monarquicos liberais, socialistas conservadores, socialismo de direita, liberais cléricais, enfim.
Ser de direita para mim é ser sincrónico com o seu tempo e o sistema. Ser a resistência à mudança e por se-lo e não vivermos num mundo iqualitário representar o capital e as classes dominantes. Quem quiser faze-lo tudo bem, mas é de direita.
As mudanças que os liberais actuais propõem não são transformações, são um aprofundamento do sistema em que vivemos. É tratar da irreversibilidade deste sistema económico. O individualismo, a desregulação económica, tudo isso é apenas o capitalismo no seu pior. O resto são as exigências de sempre da direita, a castização da sociedade, a não redistribuição, a "ordem" e o anquisolamento.
Em relação ao "direito natural" existem dois pontos que para mim revelam a direita tal como ela é. o primeiro foi a forma como defenderam a guerra contra a opinião generalizada das pessoas. A forma como contestaram referendos contra a vontade de pessoas. Onde está o respeito pelas vontades individuais, o direito natural das pessoas terem um governo que respeite as suas vontades?
A outra é a questão da abolição do horário minimo de trabalho. Para mim é uma questão de direito. Assim como uma pessoa tem o direito de não ser agredida na rua, também tem o direito de não ser abusada pelo trabalho. Quem quiser e assim o desejar pode pedir para ser socado e não apresentar queixa, tal como pode trabalhar horas extraordinárias e acordar o saldo. A fronteira do direito individual é fixada civilizacionalmente e não pode ser revogada por pressão do lado impositor. A comparação com outros sistemas legais não é valida. Referende-se! Retirar às pessoas a liberdade de viverem em consciencia com a sua percepção de justiça e decidirem em acordo com a sua vontade usando para isso ainda por cima o argumento da liberdade para mim vai contra o direito natural já para não falar outras coisas.

Anonymous said...

o que eu detesto mesmo é o uso de eufemismos... como o que agora está em voga a "adaptabilidade".

de resto, ainda bem que existe a implementaçao do horario de trabalho.
foi uma grande conquista do sindicalismo e espero que a coisa nao retroceda, ou teremos de aprender, novamente, que há vida para além do trabalho e do "mercado".
o homem não é so um agente economico, nem um bocado de borracha.

Anonymous said...

"o que eu detesto mesmo é o uso de eufemismos... como o que agora está em voga a "adaptabilidade"."

Pois e fala-se do politicamente correcto. há quem encha a boca de "cigano" e "preto" e depois caminhe nas pantufas da "maximização" da "flexibilidade" e "reajustamento". O económicamente correcto é bastante mais cínico.

Anonymous said...

Essa está genial, Ferro.