Sunday, August 12, 2007

A questão das armas (II)









Um ponto que dá que pensar acerca da questão das armas nos EUA é que a posse de pistolas, "armas de assalto", etc. é mais ou menos livre e qualquer restrição (mesmo apenas exigir um registo de proprietários) é vista por muitos como um atentado aos direitos individuais, enquanto a posse de navalhas de ponta e mola é ilegal em grande parte dos Estados (também o é em Portugal, mas cá não consideramos as metralhadoras um direito constitucional). E todos os argumentos que podem ser usados para defender o direito à posse de pistolas (e, sobretudo, do uso de pistolas ocultas) também podem ser usados para defender o direito à posse de navalhas.

No entanto, os lobbies das armas nem se parecem preocupar muito com isso: no site da NRA não encontro nenhuma referência ao assunto; no site dos GWO, a única referência é um texto elogiando a legislação de armas do Alasca, que, entre outras coisas, proíbe as navalhas de ponta e mola (ponto 5). É verdade que a NRA é a National Rifle Association, isto é, uma organização destinada a defender a posse de armas de fogo, mas o próprio facto de o lobby das armas se organizar à volta de defesa das armas de fogo (em vez das armas brancas) é sintomático.

A minha possível explicação (vindo de alguém que nunca pôs os pés nos EUA...): suspeito que se trata se uma questão cultural (ou folclórica, no sentido mais profundo da palavra "folclore") - as armas de fogo estão associadas à mitologia da "América profunda", junto com as tortas de maçã, os cowboys, etc.; pelo contrário, as ponta-e-mola evocam a ideia de delinquentes juvenis urbanos, provavelmente filhos de imigrantes.

4 comments:

Luiz Eduardo said...

Essa questão das armas pra mim é bem complicada, por causa das condições estatais em que vivemos. Vou explicar melhor.

Eu acredito que se vivêssemos em uma realidade em que o princípio de cooperação voluntária fosse respeitado, se as pessoas se associassem de maneira não coercitiva em organizações de defesa mútua (ou qualquer outro tipo de associação voluntária, como a contratação de milícias privadas ou as agências de segurança "anarco-capitalistas" etc), o modelo escolhido certamente iria restringir de alguma forma o acesso à armas de fogo. Talvez não numa sociedade como a americana, onde há esse culto às armas, mas de maneira geral, eu penso que seria assim. Eu certamente apoiaria um modelo de organização em o acesso às armas fosse restringido.

A questão é, uma vez que a forma de associação é voluntária, não haveria problemas éticos na restrição à liberdade de portar armas. O problema é que na realidade estatista coercitiva a restrição à liberdade imposta pelo controle das armas é injustificável eticamente.

Alguém poderia responder neste ponto que TODA a ação estatal é injustificável, essa é apenas mais uma entre outras. E que esta pelo menos tem um aspecto prático que pode servir como argumento, armas são "bens" que causam "externalidades negativas" (hehehehehahahahah), e que, portanto, sendo mais uma entre outras e havendo motivos práticos para defender ela, essa não deveria ser uma prioridade no "ataque" aos argumentos pró-estado. Eu nem quero entrar nesse mato espinhoso desse ponto de vista. Mas, pra mim, é um tanto óbvio que a restrição às armas é um tipo ESPECIAL da ação estatal, porque ela potencializa o poder de opressão do estado. Além do monopólio do uso da força o estado ganha o monopólio dos MEIOS de uso da força.

E por isso pra mim é tão complicado formular alguma opinião mais decisiva no assunto. Apesar de não ser um entusiasta da idéia de liberdade irrestrita de posse de armas (eu até acredito que alguma restrição surgiria naturalmente, mesmo num sistema legal voluntarista), eu também não posso engolir os argumentos estatistas em favor do controle das armas.

Enfim, de uma forma geral é isso.

Luiz Eduardo said...
This comment has been removed by the author.
Luiz Eduardo said...

Sobre essa relação da cultura norte-americana com as armas de fogo, eu acho lamentável que em vez de ser uma coisa jeffersoniana de necessidade auto-defesa contra as violações do estado, me parece mais um culto besta a uma auto-imagem de nação de cowboys.

Enfim.

Eu gosto da solução da minha namorada: "Mas não seria melhor se todas não se simplesmente não se produzissem armas?"

Anonymous said...

Miguel, interessante este cartoon.

Acho que resume bem o "culto às armas" (que não acredito existir).

http://www.bigheadpress.com/TheTimeSink/wp-content/uploads/1775vs2005d400.jpg