Monday, July 17, 2006

A Guerra Civil de Espanha e a República








A 17 de Julho de 1936, o exército espanhol, dirigido por oficiais conservadores, revoltava-se contra o governo da Frente Popular. No entanto, o que parecia um simples golpe militar revelou-se mais mais complicado: durante os dias 18 e 19, em grande número de cidades, socialistas e anarquistas pegaram em armas e derrotaram o golpe - refira-se que a República teve 3 primeiros-ministros num dia: 2 foram tiveram que se demitiram por se recusarem a distribuir armas à população para enfrenter os sublevados.

Espanha ficou dividida em duas: a zona controlada pela junta militar rebelde, e a zona controlada pelo governo eleito, apoiado pelas milicias populares que se formaram nesses dias. Apesar de, inicialmente, controlar as zonas mais ricas e povoadas de Espanha, a República começou a enfrentar dificuldades: em primeiro lugar, enquanto os "Nacionalistas" tinham o apoio militar de forças regulares alemães e italianas, os Republicanos, em termos de combatentes externos, quase só tinham brigadas de voluntários.

Mais importante ainda, as divisões no campo republicano haveriam de se revelar decisivas: como notou George Orwell em "Homenagem à Catalunha", "a sua [da classe trabalhadora] resistência foi acompanhada por um levantamento - quase se poderia dizer que consistiu num levantamento - definitivamente revolucionário. Os camponeses apoderaram-se de terra; os sindicatos tomaram conta de muitas fábricas e de grande parte dos transportes". Os republicanos dividiram-se a respeito dessa situação: os anarquistas, a ala radical do PSOE (representado por Largo Caballero, primeiro-ministro desde Setembro de 36) e o Partido Operário de Unificação Marxista (partido resultante de uma fusão entre ex-trotskistas e ex-comunistas) apoiavam o processo revolucionário; pelo contrário, os liberais, o Partido Comunista e ala moderada do PSOE defendiam a manutenção do sistema "capitalista" (os liberais pelas razões óbvias, os outros porque achavam que primeiro era preciso ganhar a guerra).

Também a respeito da organização do exército essas duas facções se enfrentavam: os "radicais" pretendiam manter o sistema de milicias, enquanto os "moderados" pretendiam transformá-lo num exército "normal", com um corpo de oficiais, etc.

Inicialmente, os "radicais" dominavam, tendo (como Orwell atrás referiu) áreas significativas da Espanha republicana (nomeadamente na Catalunha e Aragão) sido convertidas ao socialismo libertário. No entanto (segundo alguns, devido à URSS ser o único país importante que apoiava a república, o que dava prestigio ao PC), a república foi virando "à direita" (ou "ao centro", se preferirem) - o primeiro passo foi a criação do Exército Popular que, em teoria, substituia as milícias (na prática, a principio, as mílicias foram simplesmente rebatizadas como "divisões" do Exército - segundo Orwell, a imprensa comunista usava essa ambiguidade para, quando havia uma vitória, noticiá-la como uma vitória de uma divisão do Exército Popular, e quando havia uma derrota, noticiá-la como uma derrota de uma milícia).

Em Maio de 1937, rebenta o que por vezes é chamado "a guerra civil dentro da guerra civil": em Barcelona, a Guarda de Assalto tenta ocupar a Central dos Telefones, controlada pela CNT (o sindicato anarquista). Os anarquistas resistem e a cidade de Barcelona mergulha em combates de rua entre os anarquistas, o POUM e os trotskistas, por um lado, e os comunistas, o exército e a policia, por outro. Apesar de controlarem a maior parte da cidade, os anarquistas e "poumasistas" aceitarão um cessar-fogo, permitindo ao Partido Comunista e à Guarda de Assalto controlarem a situação.

A CNT e o POUM aceitaram o cessar-fogo motivados pela ideia que o principal era derrotar Franco e que o campo republicano tinha de se manter unido, mas os "moderados" não tinham tantos escrupulos "unitários": poucos dias depois os governos da República e da Catalunha são remodelados, sendos os anarquistas e o POUM excluidos (claro, pode-se perguntar o que é que os anarquistas estavam fazendo no governo...) e Caballero substituido por Negrin. Os anarquistas começaram a ser desarmados e, meses mais tarde, o POUM é proibido, sendo grande parte dos seus militantes e dirigentes presos (e alguns assassinados, como Andrés Nin).

Há fortes razões para argumentar que a politica "direitista" da Frente Popular (e do PC em particular) pode ter enfraquecido a causa republicana: nos primeiros tempos, o governo foi salvo pelo heroismo da classe operária (nomeadamene, dos anarquistas) - mas, a partir do momento em que o governo começa a reprimir os operários, porque é que estes haveriam de continuar a lutar pela República? Além disso, essa politica levou a Frente Popular a descurar oportunidades estratégicas - p.ex., um dos corpos de elite do exército franquista era a cavalaria moura (do então Marrocos Espanhol). Ora, se a República tivesse um governo de esquerda radical, que proclamasse o direito à autodeterminação do Marrocos Espanhol, talvez isso tivesse levado os "mouros" a mudarem de campo (recorde-se que a revolta de Abd el Krim tinha ocorrido há pouco mais de 10 anos).

Os comunistas também não se preocupavam muita com considerações de ordem militar na sua repressão contra os anarquistas e o POUM: durante os combates de Maio, estavam prontos a retirar unidades da frente para combater em Barcelona (enquanto as milicias do POUM e da CNT praticamente ignoraram os combates); aquando da ilegalização do POUM e da vaga de prisões que se seguiu, também ocorreu responsáveis que levavam ordens ou informações importantes serem detidos e os documentos que levavam simplesmente atirados para os arquivos da policia.

Finalmente, a 4 de Março de 1939, o "Exército Popular" (que, segundo um anarquista, "de popular só tinha o ser recrutado entre o povo, e isso acontece sempre") dá o seu proprio golpe de Estado (pelo vistos, confirmando as suspeitas dos anarquistas e poumasistas face aos corpos de oficiais...) e o novo "Conselho de Defesa Nacional" tenta negociar a rendição, mas Franco limita-se a ignorá-lo e a avançar com o seu exército pelo território republicano adentro. A 1 de Abril de 39, a guerra termina.

Teoricamente, a República Espanhola continuou a existir no exílio, até se ter auto-dissolvido em 21 de Junho de 1977, mas no final só era reconhecida pelo México e pela Jugoslávia.

1 comment:

Anonymous said...

os ultimos resistentes na guerra espanhola foram anarquistas e socialistas.
apesar de terem a oportunidade de fugir, como muitos outros, eles continuaram.

terra e liberdade... (há muito tempo que não ouço isto)